segunda-feira, 20 de outubro de 2008

Espiritualidade e Religião

Que papel desempenha as religiões oficiais no despertar da nova consciência? Há muitas pessoas que já estão conscientes da diferença entre espiritualidade e religião. Compreendem que ter um sistema de crenças – um conjunto de pensamentos que consideramos ser a verdade absoluta – não nos torna espirituais, independentemente da natureza dessas crenças. Na realidade, quanto mais fazemos dos nossos pensamentos (das nossas crenças) a nossa identidade, mais afastados estamos da dimensão espiritual dentro de nós. Muitas pessoas «religiosas) estagnaram a este nível. Equiparam a verdade ao pensamento e, uma vez que se identificam totalmente com o pensamento (com a mente), afirmam estar em poder da verdade, numa tentativa inconsciente de proteger a sua identidade. Não se apercebem das limitações do pensamento. Se não acreditarmos (pensarmos) exactamente naquilo em que elas acreditam, estaremos errados aos olhos delas e, num passado não muito distante, esse facto teria sido justificação suficiente para nos matarem. E, por vezes, ainda hoje continua a ser assim.
A nova espiritualidade, a transformação da consciência, está a surgir, em grande medida, fora das estruturas das religiões institucionalizadas. Sempre existiram elementos espirituais, inclusive nas religiões dominadas pela mente, apesar de as hierarquias institucionalizadas geralmente se sentirem ameaçadas por esses mesmos elementos e tentarem suprimi-los. Uma grande vaga de espiritualidade fora das estruturas religiosas constitui um desenvolvimento completamente novo. No passado, esta vaga teria sido inconcebível, sobretudo no Ocidente, onde a cultura está mais dominada pela mente, e onde a igreja cristã detinha o privilégio virtual da espiritualidade. Não se podia simplesmente dar uma palestra sobre espiritualidade ou publicar um livro dedicado a este tema sem a autorização da Igreja e, se essa autorização não fosse obtida, a Igreja depressa silenciaria os perpetradores. Porém, actualmente, mesmo no seio de certas igrejas e religiões, há sinais de mudança. É reconfortante e devemos estar gratos pelos mínimos indícios de abertura, como a visita do Papa João Paulo II a uma mesquita e a uma sinagoga.
Em parte devido aos ensinamentos espirituais que surgiram fora do âmbito das religiões oficiais, mas também devido a uma afluxo de antigos conhecimentos e ensinamentos orientais, há um número crescente de seguidores das religiões tradicionais capazes de se libertar da identificação com a forma, do dogma e dos rígidos sistemas de crenças, e de descobrir a essência original escondida no âmago da sua tradição religiosa, ao mesmo tempo que descobrem a sua própria essência. Compreendem que a nossa «espiritualidade» nada tem a ver com aquilo em que acreditamos, mas sim com o nosso estado de consciência. Por sua vez, isto determina o modo como agem no mundo e como interagem com os outros.
As pessoas que não capazes de ver para lá da forma tornam-se ainda mais firmes nas suas crenças, ou seja, na sua mente. Neste momento, estamos a assistir não só a um afluxo de consciência sem precedentes, como também a uma firmeza e intensificação do ego. Algumas instituições religiosas estarão abertas à nova consciência, outras irão reforçar as suas posições doutrinais e integrar-se em todas as outras estruturas artificiais, através das quais o ego colectivo vai tentar defender-se e «ripostar». Algumas igrejas e facções, bem como alguns cultos e movimentos religiosos, são basicamente entidades colectivas egóicas, tão rigidamente identificadas com as suas posições mentais como os seguidores de uma ideologia política fechada a qualquer interpretação alternativa da realidade.
Mas o ego está destinado a perecer, e todas as suas estruturas ossificadas, sejam instituições religiosas ou outras, como empresas ou governos, irão desintegrar-se a partir do seu núcleo, independentemente do quão enraizadas aparentem estar. As estruturas mais rígidas, as mais difíceis de mudar, serão as primeiras a sucumbir. Exemplo disto é o que já aconteceu no comunismo soviético. Por mais profundamente enraizado, sólido e monolítico que possa ter parecido estar, em poucos anos desintegrou-se a partir do seu núcleo. Ninguém previu isto. Todos foram apanhados de surpresa. E há muitas mais surpresas à nossa espera.
ECKHART TOLLE – UM NOVO MUNDO
Despertar para a Essência da Vida

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